aventureira contida
talvez, eu esteja me vendo melhor agora. acho que já sei o que aconteceu comigo.
era sempre mais fácil ser a dramática, a mimada, a fresca. eu sempre era uma menina avessa ao que fugia do meu comum. crescer autista e apegada a rotina e minhas seletividades enfatizavam muito essa noção de seleção de boa parte dos meus gostos. eu comia a mesma comida. eu fazia mesma ação. eu era uma criança rotineira. mas isso porque me dava uma certa segurança. desde nova, queria que todas as minhas experiências fossem seguras. e tempos depois, virei uma bela caçadora de controle externo, e isso me fez mal.
era sempre mais fácil ser a dramática, a mimada, a fresca. eu sempre era uma menina avessa ao que fugia do meu comum. crescer autista e apegada a rotina e minhas seletividades enfatizavam muito essa noção de seleção de boa parte dos meus gostos. eu comia a mesma comida. eu fazia mesma ação. eu era uma criança rotineira. mas isso porque me dava uma certa segurança. desde nova, queria que todas as minhas experiências fossem seguras. e tempos depois, virei uma bela caçadora de controle externo, e isso me fez mal.
só que era também uma criança que desejava demais. meio que queria tudo de bom e do melhor, e meus pais brincavam que eu deveria ser filha de casal rico. eu era empolgada demais com as coisas. queria fazer muito, era influenciada a querer ver o mundo, sonhar alto, ter prazer e felicidade. e também, quase tudo que é expressivo me agrada aos sentidos. sempre gostei de arte e de criatividade, dos mais variados tipos. sou sempre seduzida por uma foto bonita, uma roupa bacana, uma música que me fisga pela instrumental, uma comidinha gostosa… vivo pela curiosidade, e quero suprir isso o máximo que eu puder. acho que posso assumir que sou uma aventureira contida, e só agora tô notando isso. só não vou muito longe nas minhas aventuras, por ser muito contida e apegada a rotina.
só que abafei muito desse lado meu por um tempo. eu caí numa falácia de que o mundo não quer me ver brincando. eu caí num dogma falso de que não deveria ser tão eu, e que era melhor abafar até o que me faz bem. tentei ser o que esperavam de mim: uma boa aluna, com boas notas, inteligente. e isso foi uma boa fachada, pois em casa, eu era apenas uma adolescente que ainda vivia na internet jogando jogos de vestir bonequinhas, usando canetinhas como personagens de minhas histórias, e tentava uma ou outra ideia de livros, canal no YouTube, blogs e artesanato de bijuterias. tudo ideia que me cativou pela expressão e visual e um glamour idealizado na minha cabeça. mas minhas ideias fracassaram, pois eu era uma jovem que não sabia esperar as coisas darem frutos (até hoje sou assim, imediatista).
acho que cresci tentando me destacar, não querendo ser mais uma na multidão, e tentando ser um projeto perfeito de vida boa. tentei ser uma boa aluna. só que isso não condizia comigo. fingia bem. eu era uma prepotente preguiçosa, mas não queria admitir isso. o rótulo massageava meu ego, mesmo sendo uma máscara social. eu não era aquela pessoa que passava o dia inteiro sentada lendo apostila (só era assim com livros de ficção que gostava). eu era a que só estudava na véspera, e geralmente passava da média por ter boa memória. eu não era realmente desafiada a me superar, a me esforçar, que era o que eu mais precisava para meu futuro. só era elogiada pelos resultados que oferecia, e possivelmente pela "superação" do meu autismo ou por conseguir me encaixar ao rótulo de "autista gênio" que começou a ganhar força na minha adolescência. e tomei isso como uma verdade. só que caí numa mentira o tempo inteiro. e já no ensino médio, vi o quanto que me enganei.
que erro meu.
aquela boa menina não condiz comigo, mas eu tentei ser ela, por medo de ser deixada pra trás. por medo de ser só resumida ao meu autismo. por medo de ser só a autista. e então, me agarrei a tentativa de compensar o que via como falha, me vendo como uma garota inteligente. crente que não precisaria me esforçar pra mais nada, pois acreditei que só a minha cabeça bastava para me destacar. e desde que caí daquele céu ilusório, passei a ter consciência das minhas fraquezas, e lutar contra meu perfeccionismo, minha impaciência, minha autocobrança. tentei me buscar no meio de tantas pesquisas, tantas reviradas do meu passado. isso porque eu me reneguei muito. suprimi a aventureira contida em mim, por medo de que ela me atrapalhasse e estragasse tudo. mas não. ela me acrescenta muito mais do que eu imaginava.
me colocava como autoconfiante, mas estava mais para uma prepotente insegura. me via como uma sábia, mas era tola demais. eu nunca aprendi a confiar nas outras qualidades que tinha, e me apeguei a inteligência com força. e isso foi o maior erro que cometi. eu estive tentando ser grande, me mostrar, provar que era boa o suficiente pra esse mundo. para, no fim, não ter mais os aplausos que eu queria. eu tentei me moldar ao mundo, jogar o jogo do sucesso ilusório, seguir as regras impostas, pra cair na armadilha e me ver como uma fracassada. simplesmente me perdi tanto ao ponto de ter me afastado da minha aventureira contida.
eu quero resgatar essa garota de novo. eu quero fazer isso por mim e por ela. desde que parei um dos meus projetos e me dediquei a outras coisas, percebi que ela se manifesta mais quando estou criando, seja um texto ou uma imagem. e o bom é que não preciso de muito. era só agir, deixá-la livre pra criar. eu preciso deixar ela pôr sua marca no mundo, pois sabemos bem que queremos viver criando a morrer sem uma arte nossa. realizar algo, ver o que fizemos de maravilhoso, é o que nos faz bem. pois expressa bem o que nós somos de melhor.
agora, estou muito mais disposta, mais segura de apresentá-la. eu quero que essa aventureira contida faça aquele caos organizado que sempre funcionou pra mim. que eu me aposse dessa aventureira ao ponto de eu ser ela de fato. pois sou ela, bem no fundo do meu coração.
💜 X'nO, Lilac P

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